quinta-feira, 19 de abril de 2012

Verdade e Poder




Verdade e poder estão intimamente ligados. É o poder quem determina as verdades e as faz valer. Portanto, a verdade é uma invenção com objetivos específicos, com uma função clara. O poder cria formas estruturadas e massificantes para nos convencer de que tal fato é a verdade. O poder faz isso utilizando-se da razão, da inteligência e do quanto ela conhece do ser humano. Nietzsche dizia que "não existem fatos, apenas interpretações", e é isso o que o poder faz, vende a sua interpretação da realidade. E na maioria das vezes compramos. O poder é insistente, é ostensivo, e se utiliza de inúmeros veículos e formas diferentes para nos convencer.

Foucault dirá que as ciências humanas não existem senão, para conhecer o ser humano e com isso dominá-lo mais facilmente. O poder monopoliza o conhecimento e com este constrói verdades que são disseminadas no cotidiano. TV, internet, impressos, cinema, teatro, todos construindo e vendendo suas verdades. Dito isso, concluímos que a verdade não existe, ela toma a forma que determinam, é uma massa de moldar habilmente manipulada por aqueles que detém o conhecimento da técnica para fazer. Então achamos lindo, achamos perfeito e tomamos o molde como real. Ele ganha vida porque a damos. Uma verdade só se torna veraz se nela acreditamos, do contrário se desvanece.

Contudo, não é fácil nos defender dos fazedores de verdade, pois eles nos conhecem bem o bastante. E por vezes não vendem suas verdades diretamente, mas sim indiretamente. Por meio de uma história, por meio de um conceito, de uma expectativa, de uma esperança, de um sonho. O poder se utiliza de estratégias para nos padronizar, com isso, facilmente nos tornamos previsíveis, o que nos deixa transparentes. Ou seja, manipuláveis na medida em que se sabe como o indivíduo pensa, quais são seus anseios, seus desejos, que, aliás, também são instaurados pelo poder, sendo assim, fica fácil saber como vender uma verdade que mais facilmente será comprada. É tão personalizado, que quando você olha facilmente dirá: "isso foi feito pensando em mim". É tudo o que o poder queria ouvir.

Voltemos a Foucault, que muito escreveu sobre o poder, e uma de suas frases mais célebres foi: "onde há poder, há resistência ao poder". Ou pelo menos deveria ter. E só conseguiremos, sendo sujeitos pensantes e dispostos a libertar-se das fábricas de verdades. Começando a questionar, indagar sobre a função da verdade que estão lhe propondo. Se você compra uma verdade porque o amigo comprou, ou porque todo mundo está comprando, então não é uma ação livre. Compra uma fantasia e a toma como verdade. A não ser que queira viver de ilusão, faz-se necessário ter mais critério em suas escolhas. Que tem de estar pautadas em si mesmo, na sua realidade e nos seus verdadeiros interesses.

Libertar-se completamente do poder é quase que impossível, pois fazemos parte de uma sociedade. Contudo, os lampejos de liberdade podem nos proporcionar belos momentos de desfrute e paz. Como se pudesse simplesmente fechar os olhos e curtir seu universo pessoal, sem preconceitos, sem obrigações, sem culpa, sem medo, sem vaidade, sem preocupação. Simplesmente sentir-se completamente desnudado de deveres e regras, como se nada pudesse atingi-lo de forma alguma e conseguisse flutuar, diante da leveza de seus pensamentos e consciência. Quem sabe precisamos criar um escudo que nos proteja dos vendedores de verdade. E assim poder criar nossas próprias verdades, saudáveis e por isso benéficas a si mesmo.

Odair J. Comin
Psicólogo clínico, especialista em Hipnose e Escritor
Autor do livro “Mestre das Emoções”.

Fonte: Dot News Comunicação